Além da Vida

Nome Original: Hereafter
Diretor: Clint Eastwood
Ano: 2010
País: EUA
Elenco: Matt Damon, Cécile De France, George e Frankie McLaren e Bryce Dallas Howard.
Sem Prêmios.
Além da Vida (2010) on IMDb


Destinatário:

Clint Eastwood
4000 Warner Blvd.
Bldg. 16
Burbank, CA 91522-0811
USA

Mr. Clint Eastwood, escrevo-lhe essa carta pois ontem vi seu novo filme, Hereafter, em cartaz aqui no Brasil. Essa história de 3 pessoas totalmente diferentes que em lugares distantes tem seus caminhos cruzados por conta de eventos que ultrapassam o concreto e mundial. E não sei se o senhor sabe, temos uma onda de filmes sobre fenômenos religiosos que foram grandes sucesso em 2010. Não tenho dúvidas que esse público adorará seu “Além da Vida”. Não estou aqui para ensinar absolutamente nada ao senhor, quem sou eu para isso, muito menos para traçar um paralelo de seu último trabalho com a febre-espírita-cinematográfica desse longínquo país. Quero apenas fazer algumas considerações, e espero que não me entenda mal, muito menos despreze-me por conta disso. Pontuarei para simplificar:

1 - Parabéns pela iniciativa de fazer um filme sobre comunicação com os mortos. É um tema difícil e ainda pouco explorado no cinema por preconceito, mas você, conhecido desbravador, dá a cara à tapa e tenta. Porém, é um filme incompleto. Falta algo, mas ainda estou processando as mensagens no meu cérebro e não identifiquei. Talvez falte o essêncial em filmes dessa temática: alma.

O criador e seu queridinho

2 - O Matt é um ótimo ator e está muito bem como o médium George. Acredito que você deve insistir com ele em mais outros filmes. Talvez, para você, ele torne-se o De Niro do Scorsese ou a Penélope do Almodóvar. Sei que você abandonou a atuação, e particularmente prefiro vê-lo por trás das câmeras, mas sinto que George encaixaria perfeitamente para o senhor, exceto pelos lances românticos.

3 - Como sempre você sabe escolher os coadjuvantes de seus filmes como poucos. Você tem o dom de encontrar em qualquer lugar do mundo grandes atores inexistentes ao grande público e apresentá-los. Os gêmeos Marcus/Jason estão maravilhosos e têm grande potencial. Ah, muito obrigado por nos agraciar e nos trazer as belas (e competentes) Cécile De France e Brice Dallas Howard aos nossos olhos.

Os gêmeos George e Frankie McLaren, que roubam a cena em "Além da Vida"

4 - Parabéns pelas composições da trilha-sonora que o senhor criou. Lindas, tocantes e belas. Cada vez mais fico espantado com a grandiosidade de atributos que tira da cartola.

5 - Contar 3 histórias num mesmo filme exige uma montagem dinâmica. Acredito que esse é o maior pecado de “Além da Vida”. A agilidade e fluidez do filme ficou comprometida pela linearidade de como as histórias foram contadas e se entrelaçam. Certamente se você tivesse chamado o Iñarritu ou o Arriaga - em nenhum momento pense que compararia sua história com a deles, mas entenda que eles tem um histórico recente de ótimos trabalhos de montagem nos filmes que realizaram - para auxiliar na montagem, teríamos um filme grandioso, envolvente e você poderia ter brincado mais com as imagens de seu além.

6 - Talvez você não devesse ouvir o produtor Steven Spielberg e ter nos poupado de tantos efeitos, principalmente na cena do tsunami, e de arrastar além do necessário o filme. Não eram necessárias os 129 minutos de filme e conhecendo o trabalho de Steven, certamente isso é dedo dele, mas espero, incredulamente, que ele não tenha interferido em sua obra.

Infelizmente saí do cinema com uma interrogação. À primeira vista, não me agradou, mas você, Clint, pode fazer o que quiser que acompanharei e sempre tentarei entender a essência da mensagem que você tentou passar. Quem sabe daqui uns anos eu ame “Além da Vida”, você é capaz disso. Com “Invictus” tive com uma sensação melhor, talvez por conta da história tão grandiosa e mais palpável. Mas infelizmente nesses seus dois últimos trabalhos ficam aquém do restante de sua filmografia recente. Você, capaz de promover sensações de gozo cinematográfico, como quando saí da sala de cinema após ver “Gran Torino” ou depois de ver e rever “Sobre Meninos e Lobos”. Mas acontece, não dá para acertar sempre e você é bom em acertar.

Matt Damon, Bryce Dallas Howard, Cécile De France e Clint Eastwood

Entenda essa carta não como crítica, mas como a impressão de um fã que ama seu trabalho. Mas não se preocupe, sempre serei seu fã, mesmo que daqui pra frente você somente faça filmes que firam meus sentimentos mais profundos. Você é mestre e sempre será meu guia como amante dessa arte tão perversa.

Obrigado por tudo.

Vitor Stefano
Sessões

P.S.: Deixo essa carta aberta a outros amantes de Clint Eastwood e que viram seu último filme, “Além da Vida”. Quem ainda não viu, veja, pois o cinema pode causar dimensões diferentes em cada um de nós.

Comentários

  1. Só posso parabenizar pelo belo texto, pois não vi o filme ainda.Quando o vir poderei estender meu comentário.Aquele abraço.

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  2. Eu estava muito animado para ver o filme. Depois da estréia e de comentários de pessoas que eu confio, desanimei. Mas Clint é Clint e significa muito na minha vida de apreciador de cinema, foi com ele que tudo começou... E tu me fez lembrar ainda mais disso com esse lindo e intenso texto. A certeza é que Clint nunca será de um todo ruim, isso não faz parte dele, é só observar a lista de fatores positivos que citaste. Me animei novamente, verei muito em breve!

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  3. Vítor,
    Acho que você matou a charada, o que falta ao filme é "alma".
    E falta também história para preencher os 129 minutos.
    Você lembrou bem do dedo do Spielberg, especialmente na linda cena de tsunami, que parece nada ter a ver com o filme ou com Clint. Ou seja, a melhor cena do filme não deveria estar ali.
    Como já disse a amigos, tive uma reação passional quando vi o filme, um sentimento de traição, pois Clint nos tem dado tantos grandes filmes, que não dá para admitir uma obra morna como essa.
    Mas vale a máxima, mais vale um péssimo Clint que um ótimo Bruckenheimer.
    Parabéns pelo post e pelo formato de carta. Boa sacada.
    Abs!!!

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  4. Nossa! Nem sei mais como escrever cartas. Obrigado por me lembrar. A carta pessoal tornou-se algo solene, pitoresco. Não me interessei por este filme não e com esta carta aberta menos ainda. Mas somos feitos de coisas boas e ruins (quem dera fosse tão simples) e isto é o que chamamos repertório.

    Abraços, Vitor

    Leandro Antonio
    Sessões

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