Apocalipse Now

Nome Original: Apocalipse Now
Diretor: Francis Ford Coppola
Ano: 1979
País: EUA
Elenco: Marlon Brando, Martin Sheen, Robert Duval, Laurence Fishburne
Prêmios:Oscar Melhor Fotografia e Melhor Som, Palma de Ouro em Cannes, Globo de Ouro Melhor Direção, Roteiro Original e Melhor Ator Coadjuvante (Robert Duvall) e Prêmio César de Melhor Filme Estrangeiro.
Apocalypse Now (1979) on IMDb

A produção de Francis Ford Coppola retrata um dos períodos mais negros da história dos EUA. Embora baseado numa transposição literária para a linguagem cinematográfica do livro de Joseph Conrad, Heart of Darkness, o filme consegue por si só alcançar status de obra-prima.

Isto se deve ao fato de que o filme é representativo em um conjunto de dimensões humanas captadas pela lente de um diretor clássico pelo somatório de seu trabalho.

Essas dimensões podem ser apresentadas, embora sem nenhum critério hierárquico entre elas, do ponto de vista cultural e estético,do ponto de vista simbólico e do ponto de vista histórico-político.

Do ponto de vista cultural e estético o filme é marcado pelas grandes imagens da guerra.Basicamente,para situar a narração,temos um capitão das forças especiais do exército americano no Vietnã- Capitão Willard-muito bem interpretado por Martin Sheen, que recebe a missão de matar o Coronel Kurtz interpretado pelo aqui já comentado O Poderoso Chefão, Marlon Brando, que suspeita-se, enlouquecera.

O filme se inicia com uma das melhores músicas do Doors- The end- e segue em uma viagem cujo plano de fundo mostra as belas e úmidas florestas do sudeste asiático sendo inflamadas por bombas de Napalm. Para quem não sabe o que é o Napalm vale a pena recordar o famoso retrato da menina com a pele descolada:


Após aceitar a missão Willard segue rumo ao Camboja e é durante o percurso que estudando os documentos confidenciais que lhe fora dado sobre o Coronel Kurtz começa a conhecê-lo de verdade. O coronel havia sido homem exemplar, passara por grandes universidades e angariara posições nos quadros militares por mérito e destaque próprios,aos poucos se desiludindo com o fazer política do exército se isola com um grupo de seguidores vietnamitas.

É nesta travessia em meio aos ataques do exército vermelho que se dá o melhor do filme. Para levar o barco até o rio o grupo do capitão Willard conta com ajuda do Capitão Kilgore,interpretado por Robert Duvall que sendo um tanto fanático por surfe e ciente de que no grupo do Capitão Willard havia um surfista,Kilgore reverenciando o jovem,ordena um ataque a uma vila vietnamita à beira da praia para que pudesse desfrutar do talento do garoto.A atuação de Duvall é completamente absurda de boa.Os motivos que o levam a se guiar na guerra são,não vencer a guerra,mas fazer da guerra sua própria casa.Diz Kilgore em uma das passagens:

“Se eu digo que essa praia é segura para surfar é porque ela é segura para surfar.’’

Sob suas ordens, os helicópteros levantam vôo e partem em direção a vila vietnamita que resiste com ataques antiaéreos, Kilgore,em um ato de altivez e insanidade,coloca em alto volume a Cavalada das Valquírias de Richard Wagner e uma guerra se inicia ao som do maestro alemão.Após pousarem e ainda sobre tiros Kilgore ordena um ataque a floresta para forçar um cessar fogo,dois minutos depois,os aviões despejam as incendiárias Napalm sobre a floresta.

Kilgore, então deixa marcada para sempre a história do cinema de drama de guerra com a frase sádico-reflexiva mais emblemática do filme:



“I like the smell of gasoline in the morning. Its smells like ....... victory!”

No entanto, não é só de doentes mentais trajados com farda do exército que se faz a guerra.

A jornada continua e para o descanso dos soldados monta-se um espetáculo,em plena selva,em que as coelhinhas da playboy dançam e se mostram,um verdadeiro bordel na Ásia,com direito à pirotecnia o suficiente para falar à libido dos heróis americanos.

Numa última grande passagem, na realidade na ponte do Lung,uma guarnição do exército encontra-se completamente à revelia de qualquer comando.Os soldados atirando a esmo no breu da noite,ouvindo Jimi Hendrix nas trincheiras e xingando os inimigos.


No plano simbólico uma curisosidade: A triste ironia do destino fez com que a obra transformasse seu criador. Quero dizer com isso que o apocalipse se materializou, inclusive, na vida de Coppola com efeitos colaterais na sua produtora a American Zoetrope que foi a bancarrota além de ter sofrido inúmeros reveses nas florestas das Filipinas,país em que foi rodado o filme, e motivando os jornalistas da época a escreverem se referindo ao filme em termos de “apocalipse when”

Sobre isso Coppola disse em uma entrevista:

“Fizemos Apocalypse do modo como os americanos fizeram a Guerra do Vietnã: Nós éramos muitos, tínhamos muito dinheiro e equipamentos e, pouco a pouco, fomos enlouquecendo"

Do ponto de vista político histórico tem se que o passado do Vietnã pode ser entendido com a idéia de que este pequeno país da Indochina foi sempre subjugado por potências externas. Desde, aproximadamente 1885, até o fim da guerra em 1975 o país foi ocupado por franceses,japoneses,franceses novamente e os americanos,ora isso cria nos dominados uma certa ojeriza com relação a certos Estados.Embora possa ser entendida,dentro do espectro mais amplo da bipolaridade da Guerra Fria,ainda assim,a força não conseguiu abater o desejo à autodeterminação.A independência do Vietnã foi provavelmente a mais sangrenta experiência de um povo contra uma superpotência e de outro lado,ensina que não se vence uma guerra apenas com violência,a violência é o meio de que se valem os Estados para obterem seus objetivos,como já ensinava Clausewitz,mas é a Política que deve conduzir a brutalidade para os fins desejados.Estima-se que foram lançadas mais bombas no Vietnã do que durante a II Guerra Mundial contra Hither e cia .

E o papel do acaso na história é extremamente importante. Pela primeira vez o mundo assistia à guerra pela televisão, ao vivo, a opinião pública norte americana foi muito abalada e a imagem dos EUA, tido pelos seus, como uma espécie de estado messiânico do mundo, nunca mais foi a mesma.

Sem contar o os ventos da história que sobravam o mundo para outras direções,no Brasil gritavam nas ruas “abaixo a ditadura”,a pílula anticoncepcional libertou as mulheres no mundo,na França os estudantes enfrentaram De Gaulle e em Woodstock a Star Splanged Banner foi maculada por sangue,medo e explosões que saiam dos acordes de Jimi Hendrix.

Um último ponto a destacar é a referência à idéia de transformação moral que o filme traz no final.A referência ao poema de T S Eliot -Hollow Men - que é citado por Kurtz dá todo um significado moral ao filme e se coaduna com este se entendermos a viagem pelo rio como uma descoberta,por parte do Capitão Willard,de que os soldados americanos eram homens ocos,verdadeiros peões cativos por regras impostas e das quais não conseguem senão obedecer.O general Kurtz percebera esse problema e o Próprio capitão Williard atesta a insignificância daqueles que o acompanham no barco em direção ao Camboja.Kurtz, cuja vida havia sido escorreita em todos os sentidos,se revolta contra esse vazio humano,a inércia existencial,a imoralidades dos atos e a disparidade de ideais entre alguns homens e outros daí ser considera “louco assassino” e portanto,perigoso aos interesses americanos.

Neste sentido, Kurtz já havia provado o seu valor, mudara sua lógica de agir e de pensar, já lhe eram avessos os princípios pelos quais a guerra americana e os homens eram dirigidos.
O poema de Elliot se divide em três partes: Na primeira constata-se que homens são “fôrmas,sem formas”, seres empalhados e inócuos;Na segunda predomina a idéia de que nem todos são iguais; e na parte final “Twilight Kingdon”,isto é, o Reino da salvação que liberta das dores morais.

Capitão Willard,enfrenta um dilema moral.Toda sua busca se converte em consciência da obscuridade humana e a possibilidade de altera - lá.O resultado é fatal,torcendo para que o lado bom do capitão vença somos levados à contra gosto pela escolha dos Hollow Men, a vacuidade do dever cumprido não cedeu lugar a escolha do que é moralmente certo.Em um ato violentíssimo e brutal,Willard esfaqueia o general Kurtz enquanto um ritual de sacrificio acontece do lado de fora do quarto

Para concluir coloco aqui a última parte do poema the Hollow Men de T.S Eliot

Aqui rondamos a figueira-brava
Figueira-brava figueira-brava
Aqui rondamos a figueira-brava
Às cinco em ponto da madrugada
Entre a idéia
E a realidade
Entre o movimento
E a ação
Tomba a Sombra
Porque Teu é o Reino

Entre a concepção
E a criação
Entre a emoção
E a reação
Tomba a Sombra
A vida é muito longa
Entre o desejo
E o espasmo
Entre a potência
E a existência
Entre a essência
E a descendência
Tomba a Sombra
Porque Teu é o Reino
Porque Teu é
A vida é
Porque Teu é o
Assim expira o mundo
Assim expira o mundo
Assim expira o mundo
Não com uma explosão, mas com um suspiro.

Não,com efeito o mundo não vai acabar com uma explosão será com um suspiro baixo e macabro,quase onírico de Horror,Horror.

Fernando Moreira dos Santos
Sessões de Cinema

Comentários

  1. São tantas referências e intertextos que Apocalipse Now podem suscitar. O VHS continua aqui em algum lugar confortável da estante de casa. Aliás nunca vi este filme em formato DVD. Diante do texto do Fernando, acho que terei o antigo prazer de rebobiná-lo de novo.

    Leandro Antonio
    Sessões

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