Cinema e Literatura: Lars Von Trier e Marquês de Sade
Nome original: Dogville e Justine:As desditas da virtude
Diretor: Lars Von Trier e Marques de SadeAno: 2003 e 1791
País: Co-produção de Vários países Europeus
É de muito interesse a relação de amor e ódio que estes polêmicos artistas conseguem despertar nos corações de seus cultuadores e detratores, talvez a causa se encontre no fato de que eles contam histórias que nos fazem pensar em assuntos tabus e de aceitação complicada. O que os torna “persona non grata”.
Estou falando de Lars Von Trier e de Donatien Alphonse François mais conhecido como Marquês de Sade. Aparentemente não haveria motivos para escrever sobre duas personalidades distintas no tempo e no espaço, nas artes e na vida não fosse o fato de que os dois partiram do mesmo ponto de vista filosófico para se expressarem: Lars no cinema; Sade na Literatura/teatro;ambos compartilham de uma visão pessimista do homem, da sociedade e da moral.
Esse tema da descartabilidade moral do homem e a perversão da sociedade pode ser visto em duas obras de relevo destes dois artistas. No caso de Lars Von Trier analisarei Dogville e no caso de Sade analiso a obra Justine - as desditas da virtude- e estabeleço paralelos entre elas apontando suas semelhanças e seus pontos de divergências.
Datado de 2003, Dogville por seguir alguns dos 95 dogmas – que é algo discutível do ponto de vista dos estudiosos - alguns o considerando como um manifesto artístico outros como uma mera jogatina marqueteira voltada à divulgação de seus participantes – estabelece, de chofre, uma distinção que acompanhara os telespectadores durante suas quase 3 horas: não há cenários,isto é, nesta vila, a igreja, casa, escola e assim por diante, o que deveria ser paredes são apenas linhas coladas com fita crepe no chão determinando o nome e o espaço de cada lugar. A região é alguma parte anecumênica das montanhas rochosas e seu interior é apresentado por uma câmera que vem do plano superior e a voz do narrador que se apresentará ao longo do “conto” ora algo imparcial,ora algo escrachado, ora imbuído de uma ironia fina e cortante.
O filme é sobre uma garota – chamada Grace, interpretada por Nicole Kidman – que chega à dogville fugindo de um grupo de capangas e é recebida pelo autointitulado filosofo local Thomas Edison Jr, que convence a população a dar abrigo à Grace em troca desta se fazer querida pelo grupo, já que ela é uma outsider.
Para tanto, Grace procura ser útil ao grupo embora sem saber como. Ao perceber o seu deslocamento em Dogville, o filósofo a aconselha a começar por “something that you would like done but that you don’t think is necessary”.Aos poucos, Grace passa a ser aceita na vila, mas ao mesmo tempo um contratempo vem fazer com que sua permanência em dogville torne-se mais custosa.
Trata-se da polícia que está a sua procura e os habitantes de Dogville, para se manterem sob o perigo das investidas da força pública começam a “mostrar seus dentes”.Com a desculpa de permanecerem calados Grace é submetida à exaustão física, humilhação moral e abusos sexuais.
Já o conto Justine -les malheures dês las virtues- pertence ao século XVIII e nele Sade nos trás a história de uma garota que sofre os maiores infortúnios para se manter virtuosa. Brevemente, temos duas irmãs (Justine e Juliette) opostas uma da outra.
Juliette se rende aos vícios da sociedade francesa e alcança o seu topo, Justine, se preserva de toda a hipocrisia e padece os maiores suplícios no subsolo da escada social burguesa.
O conto narra a história de uma maltratada o que faz com que o leitor sinta sentimentos de pena e compaixão mas antes que tais sentimentos tenham tido tempo de se sedimentar Justine fala com amor da pessoa que a maltrata o que gera uma contradição na mente de quem lê.
Desta forma, tanto quanto em Dogville quanto em Justine os opressores são tratados com enfermos que precisam de tratamento, que gera pena, aquele idéia velha do tratamento do bom samaritano: “tratar bem ainda que sofra”. Os supliciadores, nos dois casos, possuem as mais diversas caras – padres, colegas, velhos, ricos e pobres.
O que fica é a ambivalência, a cegueira, a dependência e a solidão destes mártires femininos cuja única tristeza na vida é não terem podido ajudar esses seres miseráveis que as oprimem.
Tanto Grace quanto Justine padecem de um complexo de masoquismo moral em que o sofrimento que recebe serve para expiar a culpa de si mesmo. Há uma estranha forma de sacrificar a subjetividade em prol do outro. O fundamental é que o outro goze. A diferença é que cada uma tem um destino .Grace se subleva –após uma conversa franca e creio mais belas do cinema de Lars - com seu pai e genocida Dogville e Justine morre com um raio que entra pela boca e sai pela vagina.
Em síntese: Lars adora Sade, mas Sade é mais sádico.
Justine está passando no Satyros. Dogville deveria passar todos os dias no canal aberto.
Fernando Moreira dos Santos
Sessões
É isso e mais coisas, Fernando. Na próxima reunião conversamos.
ResponderExcluirLeandro Antonio
Sessões
Não são 95 dogmas, mas sim 10 regras. Dogma 95 é o nome dado ao movimento criador por ele e Vinterberg.
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