Dossiê Tim Burton
Uma figura, no mínimo, exótica. Tim Burton exala escuridão e imaginação. Hoje esses elementos peculiares o credenciam como um dos mais renomados diretores do cinema. Teve grande inspiração nos sombrios livros de Edgar Alan Poe e na cinematografia de Vincent Price. Com uma bolsa de estudo foi aprender animação no maior estúdio desse gênero, a Disney, por onde foi contratado e iniciou sua brilhante carreira. Iniciou em 1982 com o curta-metragem em stop-motion 'Vincent', inspirado em seu ídolo. Veja o curta abaixo:
Os aspectos obscuros e sombrios, caracteristicos de sua carreira, já eram percebidos desde iniciante. E provava já ter talento. A partir desse curta realizado para a Disney, Burton deu continuação em sua carreira. O seu primeiro longa é um clássico da minha infância e de muitos da minha idade 'As Grandes Aventuras de Pee-Wee' estrelado por Paul Reubens onde encarna seu já famoso personagem Pee-Wee Herman, uma criança dentro de um adulto que passa por várias aventuras para encontrar a sua amada bicicleta. Bizarro e surreal. Só poderia ser Tim Burton. Já o segundo filme foi exatamente o que deu uma grande alavanca à sua carreira. 'Os Fantasmas se Divertem' consegue chegar ainda mais ao que se entende por mundo burtoninano, unindo comédia e terror a um estrelado elenco - Michael Keaton, Alec Baldwin, Geena Davis e Winona Ryder. O grande sucesso do filme credenciou o diretor a conquistar novos rumos na sua carreira.
O sucesso o credenciou à super produção de uma grande franquia: 'Batman' de 1989 e 'Batman -O Retorno' de 1992. Trouxe novamente à parceria com Michael Keaton, agora como Batman e Jack Nicholson como um fantástico Coringa. Após a nova franquia dirigida por Cristopher Nolan o Batman de Burton ficou defasado e a figura de Nicholson como Coringa, que parecia insuperavel, foi alcançada com uma performance letal de Heath Ledger em 'O Cavaleiro das Trevas'. Mesmo sofrendo muita ingerência do estúdio, conseguiu colocar um pouco de sua influência na franquia.
Entre os dois filmes da franquia, fez sua primeira obra-prima - 'Edward Mãos de Tesoura'. A primeira parceiria entre Burton e, o iniciante, Johnny Depp. Assim como Almodóvar com Penélope Cruz, Burton encontrou em Depp um parceiro perfeito para suas obras. 'Edward' é um filme totalmente surreal onde consegue mostrar o quanto o ser humano pode ser repulsivo e um homem com a deformação de tesouras no lugar das mãos pode ser mais humano que um humano. Filme estupidamente lindo sobre amor e o terror sobre o diferente. Um mundo de fantasias.
Após toda sua iniciação em animação, ele retorna como produtor de um dos seus clássicos pop - 'O Mundo Estranho de Jack'. A animação-musical foi dirigida por Henry Selick. Porém até hoje é reconhecidamente uma de suas maiores obras e um dos maiores sucessos entre o público, certamente pelo carismático Jack e sua amada Sally.
Retorna à direção em uma das obras mais sérias de sua carreira. É a cinebiografia de Edward Davis Wood Jr., 'Ed Wood', considerado o pior diretor de todos os tempos, a segunda parceria com Johnny Depp. Como o próprio biografado, o filme tem o seu ar trash. É um filme lindo, filmado em branco e preto e uma das mais premiadas obras de Burton. Concorreu à Palma de Ouro em Cannes e os Oscars de Melhor Ator Coadjuvante para Martin Landau e de Melhor Maquiagem. No elenco também participam Bill Murray, Patricia Arquete e Sarah Jessica Parker.
Aí vem um momento de baixa na carreira do diretor. Escolhas erradas na direção das comédia-ficção 'Marte Ataca!' e a refilmagem de 'O Planeta dos Macacos'. Perdoem os que gostam desses filmes, mas prefiro pular esse lado obscuro (literalmente) da cinematografia de Burton. O renascimento vem com o ótimo 'Lenda do Cavaleiro sem Cabeça', de maravilhosa fotografia, uma história fantasiosa e com o seu parceiro inseparável, que rendeu o merecido Oscar de Melhor Direção de Arte.
Em 'Peixe Grande e Suas Histórias Maravilhosas', Burton chega à sua segunda, e em minha opinião a maior, obra-prima. Com um elenco de primeira grandesa, como Ewan McGregor, Albert Finney, Helena Bohan Carter, Marion Cotillard e Steve Buscemi, entre outros. A história de Ed Bloom, o contador de histórias mescladas de lembranças do passado e fantasias criadas encantam a todos, menos seu filho. A mãe intercede e tenta aproximá-los onde o filho tentará desmembrar as verdades das histórias inventadas pelo pai. Um filme lindo, apaixonante, tocante. O menos obscuro dos filmes de Burton. Obra-Prima!
Nos últimos tempos fez uma encantadora animação em stop-motion, 'A Noiva Cadáver', que é outro sucesso de público. Nesse filme o contraste é fenomenal entre o mundo dos mortos (colorido) e o mundo dos vivos (em branco e preto). Também foi o responsável pela refilmagem de 'A Fantástica Fábrica de Chocolates' contando a história dos chocolates do Sr. Wonka. Depp fez o papel que foi no original feito genialmente por Gene Wilder. O filme ficou muito mais obscuro e não conseguiu chegar no mesmo nível do primeiro. Mas é uma experiência válida. O último filme lançado com direção de Tim Burton foi 'Sweeney Todd: O Barbeiro Demoníaco da Rua Fleet', um músical - gênero não predileto de Burton - que foi ótimamente recebido pela crítica, no qual pela Academia foi pela segunda vez agraciado com o Oscar de Direção de Arte. É um banho de sangue e uma linda homenagem ao teatro. Também colaborou com a produção de '9 - A Salvação', animação que conta a história da Terra pós Apocalípse, onde os humanos foram dizimados.
Burton é obscuro, mas é essa característica que o credencia à um público fiel e apaixonado. Quanto mais obscuro, mais burtoniano. O que esperar de 'Alice no País das Maravilhas' aos olhos do diretor? Só vendo para saber. Sua carreira é acompanhada histéricamente por uma audiência enorme, que parecem até os companheiros Johnny Depp e sua esposa, Helena Bohan Carter, nunca o largarão. Cannes esse ano lhe credenciou como presidente do Juri e terá sua 'Alice...' na abertura do Festival mais classudo do cinema mundial. Uma homenagem mais do que merecida a esse diretor que é sinônimo de diversão inteligente salpicada de escuridão.
Vitor Stefano
Sessões
Sei que sou repetitiva, mas volto a dizer que "Peixe Grande e Suas Histórias Maravilhosas" é o mais belo filme que já vi. Minha teoria é a de que o roteiro mexe com o que há de mais leve e bonito em meu subconsciente, porque sempre que o revejo, choro de felicidade, de forma inexplicável. Obrigada, sessões!
ResponderExcluirTim Burton é um verdadeiro artista. É um dos poucos, senão o único cineasta da Hollywood atual, que consegue imprimir um estilo próprio, é fácil reconhecer um verdadeiro Burton, quando se vê um.
ResponderExcluirMuito feliz a postagem do curta 'Vincent', que é a síntese de sua arte. Dá para notar que ele se mantém fiel à ela, mesmo 30 anos e bilhões de dólares mais tarde. Quem mais pode dizer isso?
Ótimo post Vítor, eu estou esperando Alice para fazer minha lista do Tim, mas seu post me inibiu, hehe
Abs!!!
Adorei o Dossiê Burton, aprendi muito com ele. Bom, gosto dele desde pequena quando vi pela 1º vez Edward mãos de tesoura, um pouco mais nova que isso vi pee-wee e lembro-me de ter muito medo do filme, nunca tive a chance de reve-lo para entender o porquê. Ed Wood é um lindo filme, é profundo e reflexivo
ResponderExcluirNine a Sauvação eu nunca vi, e peixe grande estou baixando nesse momento
Vocês podiam fazer um Dossiê do Jhonny Depp também, ia ser muito legal, pois ele tem filmes pouco conhecidos que são sem dúvida os melhores dele.
Quem comporta os padrões de normalidade estabelecidos também pode cativar-se pelo horrendo. Não é uma baita sacada!? Burton arrisca colocar o esdrúxulo e o fascinante do mesmo lado da balança e o faz com maestria. O público não impõe grandes resistências aos excêntricos senso de estética, humor e dimensão humana que seu cinema revela.
ResponderExcluirMinha vó já dizia, mas antes dela Esopo já concluía: “Quem ama o feio, bonito lhe parece”. A pergunta é: Em certa medida todo mundo é um amante do feio que não saiu do armário?
Tim Burton possui uma rara e notável percepção, que permitiu a ele continuar com as brincadeiras de bonecos e bonecas na vida adulta com o grande cuidado de entender que os mais belos encantos podem brotar do esquisito. Enquanto uns querem garimpar somente o que já se convencionou como precioso e belo, Tim não somente entende o dito precioso e pretensioso, como desperta aos sentidos humanos a beleza e preciosidade do feio e do sombrio.
Desconhecida de alguns, uma das empreitadas de Tim Burton foi escrever um livro de poemas para crianças, no Brasil o mesmo ganhou a tradução de “O triste fim do pequeno Menino Ostra e outras histórias”. Transcrevo abaixo um trecho retirado do blog “Poesia Alheia” (http://silvestrin.blogspot.com/2008/06/os-poemas-sombrios-de-tim-burton.html).
“A MENINA TRASH
Dela ninguém se esquecerá:
A cara suja de carvão,
A pele de puro cascão,
E uma catinga de gambá.
Talvez não seja difícil saber a resposta
Por que a Menina Trash vivia tão triste:
É que nunca saía do fundo de uma fossa.
Houve um único breve momento de glória
Em toda sua biografia:
Foi quando Stan, o gari, pediu a mão da guria.
O lixo do bairro era ele quem recolhia.
Entretanto antes que o consórcio
Virasse sério compromisso,
Ela tomou chá de sumiço,
Pulando num triturador de lixo.”
O que não reluz pode ser ouro.
Leandro Antonio
Sessões