Aftersun

 


As memórias de uma infância nem sempre dizem toda a verdade. Aliás, verdades não existem. São apenas lembranças que escolhemos guardar, manter e rememorar. Há diversos eventos que por vezes ficam presos em caixinhas esquecidas no HD da mente e que lá precisam ficar. Os 11 anos de Sophie nas férias com o pai no verão turco são únicas.

É um filme legado. Vemos o olhar da Sophie já adulta para aqueles dias com uma conexão lindíssima com o pai. São férias diferentes. Estão apenas os dois, ela já com seus olhares mais maduros sobre sexualidade e com uma responsabilidade extra ao ter um cuidado extremo com o pai. E dele por ela. E atrás dessa beleza há algo soturno que aos poucos se desflora mas sem nunca ser expositivo. A ternura das imagens são como sorrisos de canto de boca ao lembrar de eventos e pessoas que amamos e deixaram sua marca em nossa vida, em nossa personalidade.

O roteiro do filme diz muito com muito pouco. A relação pai-filha é um enigma. Como uma fita de vídeo antiga já borrada e sem foco. E, por vezes, amedronta. As letras musicais explicitam sentimentos. É poético já que vemos dois em um mesmo lugar mas com um vazio gigante dentro de si. Estar feliz não quer dizer nada quando não se sente vida de dentro. A felicidade é uma busca vazia, supervalorizada. Estamos todos sob o mesmo céu. Debaixo da mesma água. No mesmo quarto de hotel. Na mesma piscina de lama e nada disso nos preenche ou representa a mesma coisa. Os sentimentos são únicos e as vozes em nossa mente nos levam a criar novos lugares totalmente novos. Solitários.

Aftersun é uma preciosidade. Explora uma relação que é linda e dolorosa. É um filme que dialoga com nossa criança interna, com a redescoberta do olhar que guardamos de nossos pais. Aceitar que eles tentaram. E perdoarmos quem fomos naqueles dias. É um filme que abraça nosso legado. O nosso rastro. A nossa última dança. 

Onde você estava com 11 anos? Agora, adultos, compreendemos algumas atitudes e essa melancolia que nos acomete. O vazio que não vai embora. O voo que não voamos. Daquele abraço que nunca sairemos. E que falta faz…

O melhor filme de 2022.

Por Vitor Stefano

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